Paradoxo "Tostines"
[por Vange Leonel]coluna GLS publicada na Revista da Folha de 19/02/2006Quando iniciei minha vida de paquera e balada, no começo dos anos 80, a cidade de São Paulo já oferecia uma variedade de clubes e bares para o público homossexual. Mas, numa época pré-Parada GLBT, em que o ativismo gay e lésbico começava a se organizar no Brasil, os locais voltados para homossexuais eram um pouco mais "disfarçados" e não apareciam nos roteiros culturais GLS da grande imprensa. Eram praticamente guetos.
Muita gente pergunta por que nós, gays e lésbicas, precisamos de locais exclusivos para nos encontrar. Antigamente, a resposta seria óbvia: aqueles eram os únicos locais onde podíamos flertar e beijar sem medo de sermos agredidos por indivíduos ou grupos homofóbicos. Ainda hoje o argumento vale, visto que aversão e agressão a homossexuais continuam rolando, mesmo existindo leis para nos proteger.
Assim como heterossexuais cultivam preferências por este ou aquele bar de acordo com sua tribo, homossexuais também se concentram em alguns picos. Mas será que esta predileção por bares GLS reflete uma livre escolha ou deve-se ao fato de ali haver maiores chances de encontrarem pessoas afins? E se gays e lésbicas resolvessem paquerar em locais que não são marcados com a sigla "GLS"? Eu recebo muitos e-mails de casais homossexuais que foram convidados a se retirar de lugares "não-GLS", sob a alegação de que os clientes heterossexuais presentes não se sentiam à vontade com demonstrações homoafetivas. Afinal, o gueto nos protege ou nos aparta da sociedade? Não há resposta simples para esse "paradoxo Tostines".
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