13 fevereiro 2006
  Uma dupla do barulho
[por Vange Leonel]
coluna GLS publicada na Revista da Folha em 12/02/2006

Elas são casadas há quase duas décadas. Informalmente, já que casamento entre pessoas do mesmo sexo não é legalizado no Brasil. Mesmo assim, elas são casadas. Seus amigos solteiros costumam dizer que, se um dia casarem, querem um casamento como o delas. Os casados nelas se espelham. E todos perguntam: qual o segredo de um casamento tão firme e duradouro?

Elas dizem que não há segredo ou fórmula a ser seguida. Mas, generosamente, passam uma regrinha simples: jamais carreguem nas costas o peso da obrigação ou a expectativa da eternidade. "Nenhum amor é eterno a não ser aquele que se prolonga, indefinidamente, sabendo-se efêmero", elas dizem. Eu até usei a frase num livro que escrevi. Por essas e por outras, agradeço a elas a inspiração, a amizade e a sabedoria compartilhada.

Um dia, uma conhecida ousou dizer que ficar tanto tempo casada com a mesma pessoa só poderia ser falta de imaginação. Elas não se ofenderam com o comentário, julgando-o fruto de uma inveja tola. Mas fizeram questão de corrigir: "Engano seu, é preciso muita imaginação". Se fossem esnobes, poderiam ter citado Heráclito ("Não cruzarás o mesmo rio duas vezes, porque outras são as águas que correm nele") lembrando que o casamento não é estático nem travado de antemão: flui. Nada é monótono se existe imaginação.

Nunca vi duas pessoas tão diferentes e tão parecidas. Elas têm temperamentos quase opostos, mas concordam nos aspectos mais essenciais: na ética e no que esperam de seu amor. Porque, do amor, elas esperam só amor. Nada mais.

© Folha de S.Paulo
 
Comments:
vc e cil?
 
Muito belo!! Que admirável lição essas duas pessoas transmitem ao mundo actual onde o efémero, infelizmente, é tantas vezes a nota dominante. Saber gerir assim uma relação é obra de muito talento. A melhor boa sorte e felicidade sempre para elas!

Black Bird
 
fala mais...
 
Acabei de ler,lá no CIO, suas dicas de como se vestir de homem no carnaval e adorei.Achei você bem experiente no assunto(risos).Bem,falou com tanta propriedade, deu dicas tão importantes,que fiquei curiosa. Você sempre se fantasia ou fantasiava assim?
Beijão!!!!!
 
vange, eu tinha lido na revista. seu texto me lembrou aquele documentário que o gnt exibiu, algum tempo atrás, de um casal de lésbicas judias dos EUA. eu fiquei muito tocada com aquele programa e, como nesse seu texto, tive a sensação de estar entrando em contato com uma relação baseada no respeito ao outro. talvez, esse respeito à diferença, essa sabedoria em lidar com as diferenças seja algo que só é possível quando as duas pessoas têm o mesmo nível de maturidade. e acho que essa simbiose perfeita, que tanto procuramos, pode estar em qualquer tipo de relação: entre cônjuges, entre amigos, entre irmãos. lindo!
 
Márcia, vc acha que eu sou do tipo que fala na terceira pessoa? (hehe)

BBird, transmitirei a elas seus votos.

Chachá, vc tem sido testemunha ocular & afetiva já faz uns anos, né? Tenho certeza que elas lhe agradecem a amizade.

Anônimo, sim, eu adoro me travestir e tenho me fantasiado bastante ultimamente. E sou convincente. Outro dia fui numa festa e, na entrada, me colocaram na fila dos homens para fazer a revista da segurança.
 
ah, sei lá, achei que era uma licença poética pra celebrar vcs! hihihih... eu sou a última das românticas, hahahahaha.
 
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Cantora, compositora, colunista GLS e proto-escritora. Lésbica e feminista. Atualmente assina a coluna GLS da Revista da Folha no jornal Folha de S.Paulo e a coluna "Vange Leonel" no Mix Brasil.

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