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coluna publicada na Revista da Folha de 1/10/2005Construindo estatísticas[por Vange Leonel]
Dias atrás, na Califórnia, uma adolescente foi expulsa de uma escola católica, não por comportamento ou notas ruins, mas por ser filha de lésbicas. “Sua família não se enquadra nas normas de admissão”, foi a justificativa da escola, que exige que pelo menos um dos progenitores não se engaje em “práticas imorais e contrárias ao estilo de vida Cristão, como concubinato ou relacionamentos homossexuais”.
Imaginem se todas as escolas adotassem políticas discriminatórias barrando filhos de homossexuais: o que resultaria deste cenário hipotético?
De início, muitos pais e mães gays decidiriam ficar dentro do armário (e a sociedade continuaria a pensar que gays e lésbicas não “engendram” filhos).
Ainda assim, alguns deles poderiam se recusar a viver na invisibilidade. Mas, neste caso, onde matriculariam seus filhos? Se houvesse escolas especiais para filhos de gays, elas conseguiriam sobreviver numa sociedade hipoteticamente hiper homofóbica? Provavelmente, não. Filhos de gays ficariam sem estudar.
Se após 15 anos fizessem uma pesquisa sobre o nível educacional de filhos de homossexuais assumidos, o resultado, neste cenário hipotético, apontaria uma desigualdade: filhos de gays e lésbicas teriam maior déficit escolar.
Muitos interpretariam esses dados com acuidade, culpando a falta de acesso à escola pelo déficit. Outros, levianos, diriam que a estatística seria prova do efeito nocivo da homossexualidade sobre a educação. Claro, o cenário que descrevi é hipotético. Mas mostra como podem ser construídas e interpretadas as estatísticas.
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