Será que o cara que inventou o telefone concebeu um dia o fio substituindo cartas de amor tão perfeitamente? Ou imaginou que, tempos depois, não haveria mais fios e os celulares pequeninos, aconchegados junto ao peito, vibrariam de alegria ao anunciar a chegada de notícias muito queridas?
Os mais românticos, ou conservadores, ou saudosistas irão argumentar que cartas podem ser guardadas, ao passo que a voz ao telefone se perde para sempre. Mas, antes de se esvair pelos fios sem fios das ondas que se propagam no ar, a voz da garota que amo ecoa em meus ouvidos e repercute pelo infinito dentro de mim.
É como a melodia encantadora que alcança eternidades graças à memória afetuosa que a guarda infinitamente. Exatamente como aquelas mal traçadas de antigamente, colhidas e preservadas para serem laçadas por uma lembrança amorosa a qualquer instante e para sempre.
Impossível deixar de evocar essas variantes do tempo quando um novo ano chega -o que é imediato, instantâneo e fugaz está definitivamente atado ao que é eterno, infinito e duradouro. Como sua voz ao telefone: repetidamente inédita, como os dias do ano que me pegam de jeito, sem jeito e de peito aberto.
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Cantora, compositora, colunista GLS e proto-escritora. Lésbica e feminista. Atualmente assina a coluna GLS da Revista da Folha no jornal Folha de S.Paulo e a coluna "Vange Leonel" no Mix Brasil.