in my case it has only been painful and nasty
Ainda sobre as memórias de Djuna Barnes, um trecho do livro, exemplo do humor espirituoso da escritora (e aproveitando que toquei em assuntos gasosos ali em baixo).
escreve Hank O´Neal sobre um encontro com Barnes:
"She once asked me to buy a book, any current book I might buy for myself, bring it by, and then read her a few pages. I chose a new Beckett book, ´Company´. The next day I called on Barnes and told her I had a new book by her old friend, Samuel Beckett. She was interested in what he might be writing and asked if I´d read some to her. I began, and after about two paragraphs she stopped me and said, ´Mr. O´Neal, everybody farts. Most people can stand the smell of their own farts but do not enjoy the farts of others. This is Sam Beckett farting.´ I put the book back in bag and we both laughed."
Life is painful, nasty and short...
Já faz um tempo que eu estava atrás deste livro de memórias sobre os últimos anos de vida da escritora
Djuna Barnes. Na semana passada comprei um exemplar usado pela Amazon. Estou devorando o livro. Djuna Barnes é, definitivamente, uma de minhas escritoras favoritas e uma personagem ímpar. O autor do livro,
Hank O´Neal, conviveu e conversou com Barnes ao longo de 3 anos, enquanto a ajudava em tarefas cotidianas como organizar papéis, agendar consultas médicas, mediar contatos e etc. As memórias de O´Neal sobre os derradeiros anos da escritora (que morreu em 1982 aos 90 anos) são preciosos, já que Barnes vivia reclusa em seu apartamento em
Patchin Place (Greenwitch Village, Nova York) longe dos olhos do mundo .
O título livro é um chiste célebre de Djuna Barnes que, além de escritora e artista gráfica, era uma frasista de primeira: "
Life is painful, nasty and short... in my case it has only been painful and nasty" (A vida é sórdida, sofrida e curta... No meu caso, apenas sórdida e sofrida).
Na foto da orelha do livro (abaixo), O´Neal está na porta do apartamento de Barnes. Eu fiz questão de visitar Patchin Place, uma das raras ruas de vila em Manhattan, para ver e farejar onde Barnes viveu seus últimos reclusos 40 anos (na foto, eu olho para sua janela).
foto de hank o´neal © by commerce graphics foto de vange leonel © by cilmara bedaque
Pérfidus e Flatus
PIE (idioma Proto-Indo-Europeu) é um suposto idioma original que teria dado origem a todas as línguas mortas que já esquecemos e as vivas que conhecemos até hoje. Infelizmente, tendo nascido antes da escrita, os lingüistas só podem adivinhar os vocábulos do idioma PIE. Para isso, comparam as palavras de várias línguas existentes hoje, analisam sua trajetória histórico-geográfica e tentam assim chegar à sua raiz. Os vocábulos que apresentam menor variação seriam os mais antigos e, portanto, pertencentes ao idioma original.
Entre as palavras mais antigas (li no livro "
The third chimpanzee") descobriram uma não muito nobre: “perd”, no idioma PIE, que teria derivado para o grego “perdo”, o sânscrito “pardate”, o albanês “pjerdh”, o russo “perdet”, o lituânio “perdzu”, o inglês “fart” e o português “peido”.
Li ontem num
site que os romanos honravam dois deuses distintos, um para cada tipo de emissão gasosa: Pérfidus governava os peidos mais silenciosos e sem cheiro enquanto Flatus regia os barulhentos e inodoros.
Faz sentido o “peido” ter sido logo nomeado, classificado e adorado. Afinal, a humanidade só fez crescer depois do advento da agricultura, com o cultivo de grãos deliciosos e a produção de beberagens estimulantes que só fazem fermentar em nossos intestinos.
Por falar nisso, você sabia que os intestinos medem 12 vezes a nossa altura? Sabia que produzimos uma média de 3 litros de gases por dia e que eles são liberados cerca de 17 vezes durante este período? Com tantas homenagens diárias, Pérfidus e Flatus deveriam ser os deuses mais vaidosos do panteão.
O fantasma do futebol
coluna GLS publicada na Revista da Folha em 11/06/2006por Vange Leonel
"Não tiraria da Copa, mas acho que ele nem seria convocado para uma seleção brasileira. É situação inédita para mim, então é difícil dizer como reagiria. É assunto difícil de lidar". Foi o que disse Carlos Alberto Parreira à revista "Isto É" após a convocação, respondendo sobre o que faria se descobrisse algum jogador gay na seleção. Depois, arrematou: "Fala-se muito em homossexualismo no futebol, mas pessoalmente nunca vi".
A impressão que fica é a de que não há coisa que incomode e assuste mais o amante e o praticante do futebol que a provável existência de jogadores gays. A homossexualidade parece ser o grande fantasma do esporte: muitos comentam, ninguém confirma. O fantasma nunca é visto, mas se torna popular, tantos são os indícios de sua existência.
Depois que Martina Navratilova revelou-se lésbica, o esporte feminino tem visto atletas de ponta assumirem sua homossexualidade, caso da tenista Amélie Mauresmo e da jogadora de basquete Sheryl Swoopes. No esporte masculino, parece que não há clima para sair do armário. Por quê? "Mulher-macho" pode, mas gay não combina com a macheza do esporte? Quem disse que gay não é macho? Aliás, quem disse que esporte é coisa de macho? A torcida uniformizada enfurecida com pedras nas mãos? Hipermasculinidade é desequilíbrio.
© Folha de S.Paulo
A culpa é do feromônio
coluna GLS publicada na Revista da Folha em 28/05/2006[por Vange Leonel]
Feromônio é uma substância que os animais liberam para atrair parceiros sexuais. Há alguns anos
cientistas suecos pesquisam a existência desse hormônio em seres humanos, comparando a reação de homens e mulheres (hétero e homossexuais) expostos ao suor e à urina de ambos os sexos. Depois de descobrir que mulheres heterossexuais e homens gays acionam as mesmas áreas do cérebro quando cheiram o suor de outros homens e que lésbicas e homens hétero reagem igualmente quando expostos à urina feminina, os cientistas acreditam haver indícios da existência de feromônios humanos. Mais: os receptores nasais para captá-los teriam correlação com a orientação sexual.
O fato é que feromônios nos lembram de que a atração sexual possui um componente irracional que nos aproxima dos outros animais. Não à toa, usamos metáforas olfativas para descrever momentos em que o instinto fala mais alto que a razão. Quantas vezes farejamos uma oportunidade ou algo não nos cheira bem?
Escritores e poetas também usam e abusam dessas metáforas.
Djuna Barnes certa vez escreveu uma fábula cômica ("
Ladies Almanack") sobre uma heroína lésbica que arrebanhava pupilas como cadelinhas e as treinava para que fossem boas farejadoras de mulheres. Tudo para que se tornassem "perdigueiras puro-sangue e pointers com a certeza na extremidade de seus rabos". Culpem os feromônios.
© Folha de S. Paulo